QUINTA-FEIRA,
5 DE SETEMBRO DE 2013
Donald Sassoon*
Via O Diario.info
O
sionismo desempenha um papel central na infindável tragédia do Médio-Oriente. A
luta pela paz exige o persistente desmascaramento dessa ideologia racista,
assente sobre falsificações históricas, sociológicas, culturais e
pseudo-religiosas, que busca legitimar uma acção de ocupação e usurpação
territorial ao serviço da estratégia global do imperialismo.
Neste
segundo volume da sua trilogia sobre estudos judaicos, Shlomo Sand explora como
a “Terra de Israel” foi inventada e desmascara a mitologia nacionalista-sionista
popular.
Em
2009, Shlomo Sand publicou “A Invenção do Povo Judeu“, no qual afirmou que os
judeus têm pouco em comum uns com os outros. Não existe uma linhagem ética
comum em virtude do elevado índice de conversão na antiguidade. Também não têm
uma linguagem comum, pois o hebraico era unicamente utilizado para efeitos
litúrgicos e não era nem falado no tempo de Jesus. O ídiche era somente
utilizado pelos judeus asquenazes. O que resta para os unir? Religião? Mas
religião não cria um povo – vejamos o caso dos muçulmanos e dos católicos. Além
de que muitos dos judeus não são religiosos. Sionismo? Não passa de uma opção
política: alguém pode ser escocês e não ser partidário do nacionalismo escocês.
Além de que muitos judeus, incluindo sionistas, não têm a mínima intenção de
“retornar” à Terra Santa preferindo permanecer em Londres, Brooklyn ou onde
seja. Por outras palavras, a designação de “Povo Judeu” é uma construção
política, uma invenção. Agora, Sand diz-nos neste segundo volume, daquilo que será
uma trilogia, que mesmo a ideia de “Terra de Israel” foi inventada. O terceiro
volume da trilogia será “A Invenção dos Judeus Seculares”.
A
“Terra de Israel” quase não é mencionada no Antigo Testamento; a expressão mais
frequente é Terra de Canaã. Quando é mencionada, não inclui Jerusalém, Hebron
ou Belém. “Israel” bíblica é somente Israel Norte (Samaria) e jamais existiu um
reino único e unido que incluísse a antiga Judeia e Samaria.
Mesmo
que tal reino alguma vez tenha existido, não é um argumento válido para
reivindicar um estado após mais de 2000 anos. É uma ironia da História que
tantos sionistas, muitos deles seculares e socialistas usem argumentos
religiosos para sustentar as suas teses. Além disso, o relato bíblico deixa bem
claro que os judeus, liderados por Moisés e depois por Josué, foram
colonizadores e ordenados por Deus para exterminar “tudo o que respire”.
“Destrói-os
completamente – Hititas, Amoritas, Cananeus, Ferezeus, Hivitas e Jebuseus -
como o Senhor vos ordenou”. Imagem se os Amoritas voltassem para reclamar a sua
antiga terra. Se o fizessem, isto é o que Deuteronómio 20 tem a dizer: “Passem
pela espada todos os homens … Quanto às mulheres, crianças, gado e tudo o mais…
podem tomá-los para vós como pilhagem”. Hoje em dia, uma injunção deste tipo
iria levá-lo directamente para o Tribunal Penal Internacional.
A incerteza quanto ao que constitui exactamente a “Terra de Israel” perdura até hoje. Existe um estado de Israel reconhecido internacionalmente com fronteiras claramente definida (A Linha Verde de 1967 resultou da expansão que se seguiu à guerra de 1948) e existe a “Terra de Israel” cujas fronteiras dependem de quem está a falar; para alguns isso inclui toda a Cisjordânia, para outros toda a Jordânia. Para muitos, inclui parte da Turquia, Síria e Iraque, pois Deus prometeu a Abraão e aos seus descendentes “esta terra, desde o rio do Egipto até ao Eufrates”.
A incerteza quanto ao que constitui exactamente a “Terra de Israel” perdura até hoje. Existe um estado de Israel reconhecido internacionalmente com fronteiras claramente definida (A Linha Verde de 1967 resultou da expansão que se seguiu à guerra de 1948) e existe a “Terra de Israel” cujas fronteiras dependem de quem está a falar; para alguns isso inclui toda a Cisjordânia, para outros toda a Jordânia. Para muitos, inclui parte da Turquia, Síria e Iraque, pois Deus prometeu a Abraão e aos seus descendentes “esta terra, desde o rio do Egipto até ao Eufrates”.
No
judaísmo tradicional não existe qualquer determinação de “regresso” à “Terra de
Israel”. O ritual “próximo ano em Jerusalém”, que faz parte da oração do Sêder
de Pessach, nunca foi uma chamada para reivindicar ou reconstituir um estado.
No
século XIX, aqueles que defendiam o “regresso” dos judeus à Terra Santa eram
mais cristãos sionistas que judeus. Lord Shaftesbury, um Tory compassivo que
contribuiu para a melhoria das condições de loucos em asilos e crianças nas
fábricas (The Ten Hours Act, 1833), lutou incessantemente para promover uma
presença judaica na Palestina. Shlomo Sand descreve-o como um Theodor Herzl
antes de Herzl, e com razão pois parece que foi Shaftesbury quem criou a famosa
frase “Uma terra sem povo para um povo sem terra”. Claro que ele tinha a
esperança que os judeus se convertessem ao cristianismo. Lord Palmerston, do
lado liberal, também se entusiasmou com a ideia, não por se importar com os
judeus (ou cristãos), mas porque pensava que se os judeus britânicos
colonizassem uma parte do Império Otomano, isso aumentaria a influência
britânica.
Nessa
altura, poucos judeus eram sionistas. Quando perseguidos, como aconteceu no
Império Russo, preferiam fugir para as novas terras de emigração, como a
Argentina ou os Estados Unidos, do que para a Terra Prometida. O que terá feito
possível o “Estado de Israel” não foi a promessa de Deus, mas sim o Holocausto
e a relutância ocidental de providenciar refúgio aos sobreviventes.
Grande
parte do que Shlomo Sand revela é conhecido pelos especialistas. O seu feito
consiste em desmascarar a mitologia nacionalista que reina em grande parte da
opinião popular. Também normaliza os judeus, uma vez que desafia a crença no
excepcionalismo. O Holocausto foi um evento único, mas a ladainha nacionalista
é basicamente semelhante em todas as nações – quase um género literário em si –
pois está dividida entre um sentido lacrimoso de vitimização e autopiedade e
uma narrativa presunçosa de feitos heróicos.
*Donald
Sassoon é professor de História Comparada da Europa na Faculdade Queen Mary da
Universidade de Londres.
Tradução:
SionismoNet
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Tomado de:
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